Governo e empresas buscam incentivar as agtechs no país

Em expansão progressiva no Brasil, o segmento de agtechs deverá receber um empurrão oficial em 2020. Empresas privadas, governo e Legislativo estudam criar o Programa Nacional de Incentivo às Startups do Agronegócio. O objetivo é estimular o financiamento de bolsas de pesquisas nos programas de pós-graduação das universidades com foco no desenvolvimento de soluções inovadoras e no empreendedorismo tecnológico voltado ao setor.

Com as contas públicas cada vez mais apertadas, a maior parte do financiamento deverá vir do setor privado. A ideia foi apresentada no ano passado pelo senador e vice-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Luis Carlos Heinze (PP/RS), à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), vinculada ao Ministério da Educação. Heinze já promoveu encontros em Brasília e em São Paulo com empresários do ramo para apresentar a iniciativa.
“Quero incentivar as universidades, os estudantes e as empresas brasileiras de carnes, de grãos e de defensivos, entre outras, a estimular as startups do agro no Brasil inteiro”, afirmou o senador ao Valor.
Flávio Camargo, professor de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que coordena a área de Ciências Agrárias da Capes – que mantém 370 cursos e 225 programas de mestrado e doutorado no país – encampou a proposta de Heinze. Segundo ele, é uma oportunidade para o Brasil não perder o passo no desenvolvimento tecnológico no campo.
Camargo ainda vê fragilidades no perfil dos criadores de agtechs no Brasil, entre as quais a limitação das áreas de atuação dessas empresas, o baixo nível de especialização dos empreendedores e falta de foco a longo prazo. E, segundo ele, muitas startups têm sido criadas apenas para depois serem vendidas para grandes corporações. “A preocupação é melhorar a sobrevida das empresas e dar alguma coisa de subsídio de formação para criar no país uma cultura da inovação dentro do mundo do agro”, afirmou.
O Programa de Pós-Graduação Profissional (Profagro) em elaboração terá uma estrutura curricular específica para desenvolver a cultura da inovação com a criação de agtechs. Essa estrutura contemplará disciplinas, atividades extracurriculares e trabalho de conclusão aplicado, com possibilidade de criação de empresas, produtos e patentes. Camargo já detalhou as diretrizes da proposta e criou um projeto-piloto.
O modelo proposto é para 20 estudantes, com bolsas de três anos para curso de mestrado, iniciação tecnológica, desenvolvimento tecnológico e industrial e o projeto de inovação, e tem valor estimado de R$ 2,5 milhões. O plano envolve financiamento público e privado.
Por parte do governo, a proposta prevê a participação de instituições como Finep, vinculada ao Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Telecomunicações, Fapesp, Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) e BNDES, com injeção de recursos e também incentivos fiscais e isenções. Do lado privado, o projeto pretende atrair os fundos de investimentos BR Startups e a SP Venture, além do Bradesco.
As empresas privadas teriam retorno proporcional ao investimento feito em caso de a startup deslanchar. Os rendimentos seriam repartidos com professores e alunos.
Em outra frente, o governo federal tem mapeado, desde dezembro do ano passado, diversas iniciativas isoladas que ministérios e órgãos públicos já desenvolvem para estimular startups em geral, não só as agtechs. A ideia é unificar os trabalhos e criar uma política pública nacional de incentivo ao segmento ainda sem data para ficar pronta.
O diretor do Departamento de Apoio à Inovação Agropecuária do Ministério da Agricultura, Luis Cláudio França, afirmou que a Pasta vai realizar fóruns de inovação pelo país para promover a criação de agtechs. A meta também é criar mais quatro polos de inovação e tecnologia ainda esse ano. No fim de 2019, a ministra Tereza Cristina inaugurou o primeiro o primeiro polo seguindo esse modelo, em Londrina (PR).
Ainda sem uma política pública específica, o segmento também não foi regulamentado. Um projeto de lei de 2017 tenta criar uma legislação específica para as agtechs, mas segue engavetado no Congresso. Outro, de 2019, cria desonerações para quem criar startup do agronegócio, mas também não avançou.
Mas o número de agtechs continua aumentando. Segundo a Associação Brasileira de Startups (ABStartups), são 325 em todo o país. Mas uma pesquisa conduzida por Embrapa, Homo Lundes e SP Venturno ano passado apontou que o Brasil já tem 1125 empresas desse tipo, mais da metade delas no Estado de São Paulo. É nesse número que o Ministério da Agricultura tem se baseado.
O advogado especialista em agronegócios Adamir Fiel Amorim, sócio da AB&DF, diz que a inovação tecnológica não respeita “institucionalidade normativa” e por isso qualquer lei ou regra para esse segmento tem que ser flexível. Mas ele concorda que falta uma participação mais efetiva do governo no segmento.
Entusiasta do tema, Fiel foi uma das pessoas que perceberam uma oportunidade de negócios na área de tecnologia durante o curso de pós-graduação na Fundação Getulio Vargas (FGV), em Brasília. Ele criou uma plataforma digital para mediação e arbitragem de conflitos voltada a produtores rurais. No site, chamado Agroconsenso, o tempo para solução dos casos é de no máximo 100 dias úteis e o cliente sabe o preço na hora. Segundo o advogado, na Justiça as ações demoram cerca de oito anos e têm custo inicial próximo a R$ 300 mil.
*Texto completo da reportagem do Valor Econômico sobre as Agtechs do Agro.

Por Rafael Walendorff — De Brasília

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